ANEXO I AO CURSO DE HOMEOPATIA
MÉTODO DE REPERTORIZAÇÃO
A repertorização é o procedimento que mais
inibe e desmotiva o estudante de homeopatia, levando-o múltiplas vezes ao seu
abandono e instigando-o por inércia e desencorajamento à consulta de
“repertórios”, que mais não são do que guias expeditos de prescrição sem
qualquer correspondência com a doutrina hahnemaniana, constituindo-se antes
como receitas de urgência à imagem e semelhança da medicina alopática e com
resultados duvidosos e altamente falíveis.
Nesta perspectiva, damos a seguir um
procedimento repertorial, que se pretende simples e eficaz e que tem produzido
frutos na nossa actividade prática, sem que olvidemos ainda que sinteticamente
os passos necessários à sua execução – constatará a repetição de conceitos
já explanados na primeira parte deste livro, repetição essa, que não pecará por
excesso, atenta a importância dos mesmos.
Como já se disse, os sintomas
característicos do paciente são muito mais importantes do que os sintomas e
sinais da doença.
Conforme ensinou Kent, temos de
considerar em primeiro lugar o homem no seu centro, nas suas funcionalidades
intelectuais, afeições, sintomas físicos gerais, para só depois deslocarmos a
nossa atenção para a periferia, nos sintomas locais ou particulares. Iniciando
a investigação do Homem em si mesmo, pode ocorrer que os sintomas locais não
estejam descritos na patogenesia do medicamento apurado, mas o remédio cura o
enfermo – em homeopatia não há doenças, mas doentes – e estes
desaparecem.
Os sintomas comuns, que surgem em
múltiplos experimentadores de uma dada substância e caracterizam uma patologia
sem que estejam modalizados, têm reduzido valor na repertorização, bem como na
pesquisa ulterior do simillimum, ao contrário dos incomuns, que
são peculiares, raros e estranhos.
Os sintomas característicos,
individualizam ou caracterizam o paciente no âmbito da totalidade sintomática, estando
geralmente associados a modalidades de melhoria e agravamento.
Os peculiares são antes do mais,
sintomas característicos, específicos de alguns medicamentos ou do próprio
paciente.
Os raros, só muito raramente se
verificam no repertório e são constituídos por rubricas com um número igual ou
inferior a três medicamentos.
Os raríssimos ou Key notes,
encontram-se em rubricas com apenas um medicamento.
Os sintomas biopatográficos – transtornos
por... – têm grande importância, porquanto explicam na sua essência mais
profunda a origem da patologia que nos propomos curar.
Os mentais, caracterizam no
essencial um indivíduo e são auxiliados nesta tarefa pelas suas aversões e
desejos, bem como pelo seu comportamento e reacção aos elementos naturais.
Estes, devem ser sempre utilizados para a selecção final do medicamento.
Os sintomas gerais representam o
homem como um todo, na sua globalidade de entidade viva. Quando o paciente se
exprime na primeira pessoa do singular, podemos estar quase certos que se
refere a um sintoma geral: “Eu” tenho frio; “Eu” tenho sede. Segundo Kent,
estes sintomas quando modalizados, são os que melhor se adequam à
repertorização fundamentada no método de eliminação ou cancelamento. Também
Hahnemann havia ressaltado a sua importância.
Os locais ou particulares têm uma
localização específica, pertencendo em regra a um determinado órgão ou parte do
organismo. Quando examinamos a parte, examinamos o particular. Se o paciente
usa o pronome “Meu”, está quase sem excepções a referir-se a um sintoma local:
O “meu” estômago arde, o “meu” intestino não funciona, tenho dores
insuportáveis na “minha perna” quando me levanto.
Depois do enfermo ter fornecido a história
detalhada dos seus padecimentos, do prático ter obtido todas as informações
necessárias ao procedimento sobre os mesmos, interrogando-o acerca dos sintomas
etiológicos, mentais, gerais e sobre os diferentes aparelhos, bem como das
respectivas modalizações, para além de ter determinado o histórico da doença e
os antecedentes pessoais e familiares, haverá que transformar a linguagem
daquele em linguagem repertorial, destrinçando os eventuais sentidos de
rubricas similares, hierarquizando os sintomas que são caracterizadores da sua
individualidade – sintomas incomuns, característicos, raros, estranhos ou
inexplicáveis, peculiares e repetitivos.
Contrariamente ao paciente que apresenta
sintomas bem chamativos e modalizados da esfera mental ou gerais, surgem-nos
alguns com uma imensidão de queixas, a maior parte das quais sem qualquer
importância repertorial – devendo neste caso o homeopata seleccionar os mais
antigos e repetitivos – e outros com um número bastante elevado de sintomas
que respeitam apenas a uma das categorias – valerá aqui, o mais antigo e
convenientemente modalizado.
No nosso método
de repertorização, procurámos isolar os sintomas relevantes em dois grupos,
exigindo-se um mínimo de dois por grupo, que devem ser previamente
hierarquizados segundo o esquema infra – o ideal são três para cada um:
O primeiro, engloba a biopatografia, os mentais e os gerais modalizados,
enquanto que o segundo se limita aos sintomas particulares ou locais.
Podem ser repertorizados no primeiro grupo,
verbi gratia, três sintomas mentais, desde que chamativos do caso, um
biopatográfico, um geral e um mental, dois gerais e um mental e assim
sucessivamente em conformidade com os dados obtidos no interrogatório e exame
do paciente.
No segundo, escolheremos três
sintomas, mas sempre dando preferência à hierarquização apontada.
Deveremos sempre tomar em linha de
consideração que as rubricas não devem possuir um pequeno ou elevado número de
medicamentos, dando-se em regra preferência aos de maior pontuação – Grau I
e II. As rubricas com um pequeno número de medicamentos – sintomas raros
e raríssimos – serão utilizados complementarmente no final da
repertorização, para verificação de correspondências medicamentosas.
No domínio do agudo, quando são narrados
sintomas que se prendem única e exclusivamente com a enfermidade que urge
debelar com rapidez, o homeopata seleccionará um mínimo de três sintomas,
procurando sempre valorizar os incomuns e os modalizados, mas não, sem que
antes se esforce por encontrar pelo menos um sintoma característico do primeiro
grupo. Não deixará também aqui de atender à pontuação dos medicamentos, fazendo
aproximar este método do de Hering – regra do tripé.
I
- PRIMEIRO GRUPO
SINTOMAS ETIOLÓGICOS (Transtornos
por...):
Alcoolismo
(dipsomania), decepção de amor, ansiedade por antecipação, choque mental,
ciúme, cólera, contradição, humilhação, mortificação, más notícias, saudade,
remorso, susto, luto, traumatismos (ferimentos, acidentes), etc.
SINTOMAS
MENTAIS MODALIZADOS
SINTOMAS
DA IMAGINAÇÃO – Delírios, ilusões, sensações, sonhos, etc.
SINTOMAS
EMOCIONAIS – Angústia, ansiedade, avareza, choro, ciúme, cólera, humor, medo,
tristeza, etc.
SINTOMAS
VOLITIVOS – Desejos e aversões, indolência, trabalho, vontade, etc.
SINTOMAS
INTELECTIVOS – Compreensão, concentração, erros quando escreve, lê ou fala,
esquecimento, memória, valorações e juízos, etc.
SINTOMAS GERAIS MODALIZADOS (SEGUNDO KENT)
MEIO AMBIENTE – Aqui anota-se a forma como
o paciente reage de modo global ao meio natural envolvente: mudanças de tempo,
temperatura, calor , frio, humidade, correntes de ar, etc.
DESEJOS E AVERSÕES ALIMENTARES – Nesta
rubrica, não podemos valorizar uma mera apetência ou desagrado, mas antes, a
necessidade premente ou a repugnância de determinados géneros alimentícios.
FUNÇÕES FISIOLÓGICAS – Apetite, evacuações,
menstruação, micção, sede, sexualidade, sono, transpiração, etc.
LATERALIDADE – Direita ou esquerda.
SENTIDOS – Alterações da audição, olfacto,
paladar, tacto e da visão.
POSIÇÃO – Anotam-se neste item a influência
das posições no estado geral do enfermo: deitado, em pé, sentado, no sono, etc.
MELHORIAS E AGRAVAÇÕES ALIMENTARES – Não se
trata aqui de aversões ou desejos, mas dos alimentos que agravam ou melhoram o
paciente.
II
– SEGUNDO GRUPO
SINTOMAS PARTICULARES
SINTOMAS INCOMUNS – Estes são os
raros, estranhos e peculiares. Por exemplo, podemos tomar o caso de um paciente
que tem uma dor de cabeça que alivia quando a aperta fortemente com as mãos
ou com um pano.
SINTOMAS MODALIZADOS – Exemplo: náuseas
quando viaja de barco.
SINTOMAS NÃO MODALIZADOS - Dor de cabeça,
náuseas.
PATOGNOMÓNICOS – São os que respeitam à
doença e que como tal possuem muito pouco valor, como já ficou explanado, tais
como febre alta numa gripe ou secrecção nasal durante rinite.
É a modalização, determinando em que
circunstâncias melhora ou agrava o sintoma ou a totalidade sintomática do
paciente, que torna o sintoma característico e que o valoriza na escala
hierárquica (ver nota 85 em sede de Doutrina Homeopática).
Determinados os medicamentos que cobrem na
totalidade – ou quase na totalidade – os sintomas do caso clínico,
haverá que proceder ao seu estudo nas matérias médicas, de forma a encontrar a
correspondência que conduzirá o enfermo à cura.
José
Maria Alves
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